Vazamento revela 107 empresas no exterior ligadas a alvos da Lava Jato

 Firma Mossack Fonseca, na Cidade do Panamá (Foto: Carlos Jasso/Reuters)
Uma investigação feita a partir de documentos do escritório de advocacia e consultoria Mossack Fonseca, no Panamá, revela 107 offshores – empresas constituídas no exterior – ligadas a empresas e políticos citados na operação Lava Jato.
As informações, que estão sendo chamadas de Panama Papers, foram inicialmente obtidas pelo jornal alemão Süddeutsche Zeitung e compartilhadas por um consórcio de jornalistas de vários países. No Brasil, participam repórteres do portal UOL, do jornal Estado de S. Paulo e da Rede TV.

A investigação aponta que a Mossack Fonseca criou offshores para pelo menos 57  pessoas suspeitas de participar do esquema de corrupção na Petrobras.

O nome offshore é dado a empresas abertas por pessoas e empresas em um país diferente daquele em que se reside, para aplicações financeiras e compra de imóveis. Ter uma offshore não é ilegal, desde que a empresa seja declarada no Imposto de Renda.

Segundo as informações divulgadas neste domingo (3), a Mossack operou para pelo menos seis grandes empresas brasileiras e famílias citadas na Lava Jato, abrindo 16 empresas offshore, das quais nove são novidade para a força-tarefa.
Essas 16 offshores são ligadas à empreiteira Odebrecht e às famílias Mendes Júnior, Schahin, Queiroz Galvão, Feffer, do Grupo de Papel e Celulose Suzano, e Walter Faria, da Cervejaria Petrópolis. Integrantes da família Feffer não sofrem acusações da Lava Jato, mas a força-tarefa investiga a compra da Suzano Petroquímica pela Petrobras, em 2007.

O escritório brasileiro da Mossack Fonseca foi alvo da 22ª fase da Lava Jato, em janeiro deste ano. Os investigadores suspeitam que a empresa tenha ajudado a esconder o nome dos verdadeiros donos de apartamentos no edifício Solaris, no Guarujá.

Entre os políticos citados, estão o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, do PMDB, e o usineiro e ex-deputado federal João Lira, do PTB.

Os documentos da Mossack Fonseca apontam também para João Henriques, que seria um dos operadores do PMDB. Ele é sócio de uma offshore do ex-controlador do Banco BVA, José Augusto Ferreira dos Santos. O ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró citou em sua delação premiada a relação do BVA com o senador Edison Lobão, do PMDB.

O vazamento de informações da Mossack Fonseca também repercutiu em outros países. Segundo a BBC, os 11 milhões de documentos mostram como a empresa ajudou clientes a evitar o pagamento de impostos e a lavar dinheiro. Segundo a BBC, os documentos mostram ligações com 72 chefes e ex-chefes de estado.

Os dados envolvem pessoas ligadas às famílias e sócios do ex-presidente do Egito, Hosni Mubarack, do ex-líder da Líbia, Muammar Gaddafi, e do presidente da Síria, Bashar Al-Assad. Eles também levantam suspeitas de um esquema de lavagem de dinheiro comandado por um banco russo e por pessoas ligadas ao presidente da Rússia, Vladimir Putin, e ao primeiro-ministro da Islândia, Sigmundur Gunnlaugsson.

O escritório panamenho afirma que trabalha há 40 anos dentro da legalidade e que jamais foi acusado de qualquer crime.
Os “Panama Papers” contém dados de atividades de 140 políticos de mais de 50 países, além de parentes de chefes e ex-chefes de estado, empresários e figuras ligadas ao esporte e outros setores. Veja abaixo alguns dos citados e quais suas respostas ao caso.
Vladimir Putin, presidente da Rússia
O QUE SAIU:
O famoso violinista Sergey Roldugin, amigo desde a adolescência e padrinho da filha do presidente da Rússia, foi dono de três offshores, duas delas descritas pelo governo dos EUA como “bancos pessoais para altos oficiais russos”. Outros dois russos, os irmãos Arkady e Boris Rotenberg, amigos de infância de Putin, tinham pelo menos sete companhias nas Ilhas Virgens Britânicas. As empresas pertencentes aos três movimentavam negócios em praticamente todos os setores da Rússia, da construção de caminhões a emissoras de TV. De acordo com o “Panama Papers”, até US$ 2 bilhões podem ter circulado secretamente entre as companhias deles. Segundo a BBC, as offshores de Roldugin lucraram com transações falsas, serviços de consultoria inexistentes e a compra de ativos suspeitas e documentos afirmam que “A companhia é uma barreira corporativa criada principalmente para proteger a identidade e confidencialidade do verdadeiro beneficiário da companhia".
O QUE DIZ: Nenhum dos empresários respondeu aos pedidos de comentário da International Consortium of Investigative Journalists (ICIJ), responsável pela divulgação das informações.
Sigmundur Gunnlaugsson, primeiro-ministro da Islândia
O QUE SAIU:
O primeiro-ministro e sua mulher, Anna Sigurlaug Pálsdóttir, compraram em 2007 a offshore Wintris, que tinha investimentos milionários em três dos maiores bancos islandeses, que faliram em 2008 e fizeram acordos de ajuda financeira com o governo. Em 2009, ao assumir o cargo de primeiro-ministro, ele não declarou sua participação na empresa e, meses depois, vendeu seus 50% à mulher por US$ 1.
O QUE DIZ: Em uma entrevista a uma emissora de TV em março, Gunnlaugsson negou que já tivesse sido dono de uma offshore. Ao ICIJ, um porta-voz declarou agora que “o primeiro-ministro e sua esposa seguem as leis islandesas, o que inclui a declaração de todos os seus bens, seguros e lucros em restituições de impostos desde 2008”.
Maurício Macri, presidente da Argentina
O QUE SAIU:
Ao lado de seu pai, Francisco, e de seu irmão, Mariano, ele é indicado como um dos diretores da Felg Trading Ltda., incorporada nas Bahamas em 1998 e dissolvida em janeiro de 2009. Ele não declarou sua participação na empresa em 2007 e 2008, quando era prefeito de Buenos Aires.
O QUE DIZ: O porta-voz oficial de Macri, Ivan Pavlovsky, afirmou que ele não declarou a empresa porque não tinha capital de participação. A companhia, usada para participar de negociações no Brasil, era ligada ao grupo empresarial de sua família e por isso Macri foi ocasionalmente seu diretor, embora nunca tenha sido um acionista.
Joaquim Barbosa, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal
O QUE SAIU:
O ex-presidente do STF teria deixado de pagar um imposto sobre a compra de um apartamento em Miami, em 2012. De acordo com o jornal "Miami Herald", ele adquiriu o imóvel através da Assas JB1 Corp, uma offshore criada pela Mossack Fonseca, em um procedimento legal. Mas o campo relacionado ao imposto chamado documentar stamp tax, que deve ser pago no ato da compra, aparece zerado no Registro Público de Miami, o que indica que ele ainda está pendente. A taxa é de US$ 0,60 para cada US$ 100 pagos pelo imóvel e, ainda segundo o jornal, seu valor no caso do apartamento de Barbosa seria de US$ 2 mil.
O QUE DIZ: Em resposta ao “Miami Herald”, Barbosa nega irregularidades e diz que a empresa que intermediou a negociação deveria ter pagado a taxa. Ele diz ainda que o valor da transação pode ser consultado no portal Multiple Listing Service, um site privado e voltado para corretores de imóveis.

G1