Depois de guardas municipais e agentes prisionais conquistarem o
direito de portar arma tanto para o desempenho da função quanto para a
segurança pessoal, mais uma categoria requer esse tipo de licença. Dessa
vez, são os agentes socioeducativos mineiros que esperam ganhar a
autorização para andarem armados, caso o projeto de lei 1.973/2015, em
tramitação na Assembleia Legislativa, seja aprovado pelos parlamentares.
Com a norma, o autor da proposição, deputado Cabo Júlio, quer garantir o
cumprimento, pelo Estado, da lei federal 10.826/2003 (que autoriza
agentes e guardas prisionais a portar armas).“Em Minas, a interpretação
da lei foi equivocada quando restringiu o benefício apenas para agentes
prisionais”, explicou. No país, a permissão já é realidade para os
socioeducativos de Goiás e de Santa Catarina.
Discussões
Tal medida, porém, é polêmica. Para os agentes, a liberação do porte de
arma garante segurança aos servidores do sistema e aos familiares
deles, já que são ameaçados de morte dentro e fora do ambiente de
trabalho.
Por outro lado, especialistas afirmam que a autorização vai na
contramão do estabelecido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA). “O papel do socioeducativo é educar, ressocializar e estabelecer
um resgate social desse adolescente em risco. O armamento, mesmo além
dos muros, pode significar repressão”, opina a juíza Valéria da Silva
Rodrigues, da Vara da Infância e Juventude de Belo Horizonte.
O coordenador do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública
(Crisp) da UFMG, Cláudio Beato, avalia que a necessidade de posse de
arma para os agentes expõe a fragilidade no trabalho desenvolvido com os
jovens nos centros de internação. “Se esse trabalhador sofre ameaças,
significa que o trabalho de recuperação está deficitário”.
Proteção
O Cabo Júlio garante que, sancionada a lei, o uso de armamento será
apenas para a segurança pessoal dos agentes. “A norma não prevê o porte
dentro dos centros de internação”.
De acordo com o parlamentar, é “inimaginável” um agente socioeducativo
ficar a mercê de adolescentes reincidentes em atos infracionais graves,
como homicídios, estupros e latrocínios”. “Ao deixarem a internação,
esses menores colocam em risco a vida dos servidores”.
Temor
O presidente do Sindicato dos Servidores Públicos do Sistema
Socioeducativo de Minas Gerais, Keifferson Pedrosa, reforça a
vulnerabilidade dos agentes fora do local de trabalho. “Reivindicamos o
armamento para os profissionais em situação de ameaça e com condições
psicológicas para o porte. Em todo o tempo vivemos sob ameaça”.
Para o presidente da Comissão de Assuntos Penitenciários da OAB-MG,
Anderson Marques, a liberação do equipamento necessita de avaliação
individual e criteriosa, além de comprovar a necessidade dela. “E deve
ser restrita para a segurança pessoal. É inadmissível o uso desse
instrumento no ambiente de trabalho”.
A Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) não irá comentar o caso
por se tratar de projeto de lei em tramitação no Legislativo.
Profissionais afirmam que falta treinamento permanente para lidar com os infratores
Além da ameaça de morte, a qualificação falha dos agentes
socioeducativos também é apontada como mais uma fragilidade na segurança
dos profissionais. Segundo o presidente do Sindicato dos Servidores
Públicos do Sistema Socioeducativo de Minas Gerais, Keifferson Pedrosa, o
pouco tempo de treinamento para iniciar as atividades no sistema acaba
influenciando no trabalho deles.
“A orientação deficitária faz com que o risco dobre. Somos ensinados a
lidar com jovens que, na teoria, seriam de menor periculosidade. Mas,
apesar da pouca idade, eles são extremamente perigosos”, frisou.
Pedrosa afirma que os concursados recebem treinamento por 45 dias e os
agentes contratados, por uma semana. Depois disso, segundo o
sindicalista, os profissionais não são requalificados. “A capacitação
deveria ser permanente”.
A informação, no entanto, é contestada pela Secretaria de Estado de
Defesa Social (Seds). De acordo com a pasta, os concursados são
capacitados após a nomeação e durante a carreira no sistema. O mesmo
acontece com funcionários de contrato especial.
Em nota, a Seds informou que o treinamento dos agentes socioeducativos é
feito em escola de formação da própria instituição, nos parâmetros
definidos pela Escola Nacional de Socioeducação, da Secretaria Nacional
de Direitos Humanos.
No programa de capacitação, há aulas práticas e teóricas com disciplinas técnicas e troca de experiências.
Ponto de vista
Especialistas são unânimes em dizer que a qualificação dos agentes
socioeducativos em Minas expõe a fragilidade na autorização do porte de
arma para a categoria.
“O treinamento é deficitário. Falta um melhor conhecimento em segurança
e primeiros socorros”, observa o presidente da Comissão de Assuntos
Penitenciários da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Minas Gerais
(OAB-MG), Anderson Marques.
Juíza da Vara da Infância e Juventude da capital, Valéria da Silva
Rodrigues questiona a forma de preparação dos servidores. “É preciso
rever o processo de seleção deles”, afirma.
A jurista reforça que a precariedade na qualificação dos
socioeducativos reflete diretamente na recuperação e ressocialização do
jovem infrator.
Além disso
A promessa da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) é de mais
160 vagas para adolescentes infratores até 2017, quando três centros de
internação serão inaugurados em Minas.
As novas unidades serão abertas em Passos e Alfenas, no Sul do Estado –
região que ainda não conta com nenhuma instalação do tipo; e em
Tupaciguara, no Triângulo. A pasta afirma que os adolescentes terão,
nesses centros, qualificação profissional, ensino regular e atendimento
psicológico.
O Centro Socioeducativo de Alfenas será construído ao custo de R$ 15,5
milhões, recursos liberados por meio de convênio com a Secretaria
Nacional de Direitos Humanos. Já o governo estadual oferecerá uma
contrapartida de R$ 300 mil. A previsão é a de que as 80 vagas na
unidade estejam disponíveis no primeiro semestre de 2017. No momento, o
Departamento Estadual de Obras Públicas (Deop) elabora o projeto
executivo da obra.
A Seds informou que serão retomadas as obras do Centro Socioeducativo
de Passos. Um prédio público na cidade está sendo reformado e será
adaptado para receber as instalações, o que permitirá abrigar 40
adolescentes já no primeiro semestre do próximo ano.
Ainda em 2016 deverá ser inaugurado o Centro Socioeducativo de
Tupaciguara, também com 40 vagas. A implantação da unidade foi
interrompida em 2014 e, agora, serão aplicados R$ 200 mil na chamada
rede lógica (comunicações e outras facilidades) e na aquisição de
mobiliário e equipamentos.
Fonte:http://www.hojeemdia.com.br/horizontes/temendo-pela-vida-agentes-socioeducativos-querem-porte-de-arma-1.346652
Fonte:http://www.hojeemdia.com.br/horizontes/temendo-pela-vida-agentes-socioeducativos-querem-porte-de-arma-1.346652