Depois de conversar com inúmeros senadores e agentes
políticos na semana passada, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
voltou de Brasília convicto de que “o jogo não acaba” com a possível
admissibilidade do processo pelo Senado e o consequente afastamento da
presidente Dilma Rousseff na quinta-feira.
Lula tem dito a
interlocutores que, ao contrário das avaliações iniciais, o virtual
início do governo Michel Temer (PMDB) não vai significar a volta da
estabilidade política, como apregoam os aliados do vice-presidente, e
que as turbulências devem continuar até as eleições de 2018.
O ex-presidente Lula DIDA SAMPAIO|ESTADAO
.
“Ele tem convicção de que não vai parar por aqui.
Aquela ideia que tentaram passar de que a votação na Câmara representava
uma nova hegemonia estável no Congresso e no País e de que o jogo
acabou não existe”, afirmou um interlocutor do ex-presidente.
A
avaliação do petista está lastreada nas conversas que teve com senadores
ao longo da semana e em pesquisas quantitativas e qualitativas às quais
teve acesso. Segundo os levantamentos, houve uma mudança de percepção
por parte da população desde a votação na Câmara. Na Região Nordeste, o
número de pessoas contrárias ao impeachment hoje é maioria. No Sudeste,
ainda predomina a defesa do afastamento de Dilma, mas o volume de
eleitores contrários ao processo aumentou.
Lula sabe que isso não
será suficiente para mudar os votos dos senadores até quinta-feira e
admite que o afastamento de Dilma é inevitável mas vê hoje um quadro
menos desfavorável ao PT com possibilidades de recuperação até 2018,
quando deve voltar a ser candidato, e não descarta uma reviravolta na
votação do mérito dentro de até 180 dias.
Segundo um aliado do
ex-presidente, a situação melhorou mas não existe um “entusiasmo” por
Dilma. “Se a situação econômica fosse melhor haveria”, disse.
Opinião pública.
Nas conversas com Lula senadores confirmam que vão votar a favor do
impeachment embasados em pesquisas de opinião, pressão da “opinião
pública cristalizada” e de setores do empresariado contrários ao PT, mas
teriam se mostrado sensíveis às mudanças de conjuntura.
Lula
tem evitado comentar o afastamento do presidente da Câmara, Eduardo
Cunha (PMDB-RJ). A quem pede reuniões para tratar do assunto, Lula diz
que aceita “mas não vai ser hoje” e se mantém em silêncio. “Tem um
aspecto especulativo se Lula começar a opinar sobre este tema”, avaliou
um aliado.
No entorno do ex-presidente, a percepção é de que a
saída de Cunha tem aspectos positivos para Temer mas embaralha ainda
mais um quadro político considerado “esquisito”.
Embora avalie que
houve uma mudança para melhor da situação desde a votação na Câmara,
Lula não ainda mostra ter muitas dúvidas sobre os próximos passos e a
ausência de uma estratégia de ação.
“Vamos avaliando as coisas
conforme elas acontecem. Tem pelo menos uns dois ou três anos que tudo o
que acontece no Brasil ninguém prevê. Desde aquelas manifestações de
2013”, disse um auxiliar do ex-presidente.
Uma das poucas certezas
é que depois do “show de horror” protagonizado pelos deputados durante a
votação do impeachment, no dia 17 de abril, a rejeição do eleitorado ao
PT se espalhou para toda a classe política.
Aliados de Lula,
também com base em pesquisas, afirmam que iniciativas como a realização
de novas eleições ou de um plebiscito pela reforma política hoje têm
ampla maioria na sociedade mas a falta de apoio entre movimentos sociais
e setores do PT é um obstáculo.
Bandeira.
O ex-presidente está à procura de uma bandeira. Na sexta-feira, o PT
lançou a campanha “Não ao Golpe e Fora Temer”, mas o próprio partido a
considera insuficiente.